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Miopia na “demonização” do consumo por Instituto Impulso

Postando em 26/08/2013

Grassa na mídia e em ambientes governamentais a ideia de que o estímulo ao consumo já cumpriu seu papel na recuperação econômica do país e que o foco deveria agora ser direcionado para investimentos em infraestrutura. Como se essas frentes fossem incompatíveis entre si e os recursos para uma inviabilizassem apoio para a outra. Nada mais equivocado e pueril, não fosse incoerente.

 

O que foi direcionado para estímulo ao consumo nos últimos anos restringiu-se a alguma forma de desoneração do IPI para certas categorias e produtos e mais algum esforço dirigido para a desoneração da folha de pagamento de diversos segmentos empresariais, que transcendem em muito ao âmbito do consumo. De fato, o que conspirou a favor do aumento do consumo foi uma conjunção virtuosa de aumento da renda real das famílias com melhoria do nível de emprego formal e mais o aumento da oferta de crédito ao consumo e a elevação do nível de confiança do consumidor.

 

Esses elementos proporcionaram forte elevação do consumo e expansão das vendas do varejo em todo o país e criaram uma nova realidade social e econômica, sem que o governo fosse obrigado a nenhuma forma adicional de estímulos a não ser aquelas já citadas.

 

Como consequência, vivemos no período 2004-2012 uma profunda transformação estrutural do perfil de consumo que adicionou ao mercado potencial brasileiro perto de 40 milhões de consumidores, interiorizou e expandiu o mercado e criou novas realidades em termos de demanda por bens e serviços que permitiram o crescimento das vendas de varejo muito acima da evolução do PIB.

 

O investimento direto do governo para isso, considerando desoneração tributária e outros estímulos, foi mínimo e, a bem da verdade, foi ele próprio o maior beneficiário pelo aumento da arrecadação advinda da formalização de negócios que fez com que, no mesmo período, o crescimento da receita de impostos superasse por larga margem a expansão da economia.

 

Mas nos últimos meses tem havido forte pressão, orquestrada ou não, no sentido de que a prioridade do governo deveria ser redirecionada para investimentos em infraestrutura, absolutamente necessários pelas carências hoje existentes, mas que não deveriam pressupor a redução da atenção do Estado com a ampliação e melhoria do consumo.

 

De fato, há muito espaço para a continuidade da expansão do consumo, medida pela carência de produtos e serviços demandados pela população.  A penetração de alguns produtos nos domicílios brasileiros, segundo os dados da PNAD do IBGE, mostra que no período de 2001 a 2011 a presença de fogões cresceu de 97,8 para 98,9%.  A de TV a cores, produto em constante evolução, aumentou de 82,8 para 97,2% e a de geladeiras passou de 84,4 para 95,8%. Se pensarmos em máquinas automáticas de lavar roupa, item cada vez mais relevante para a mulher que trabalha fora, a penetração avançou de 32,9 para 50,9%.

 

Inegavelmente existiu uma clara e virtuosa expansão, mas, se pensarmos em termos mais amplos, só para falar em máquinas automáticas de lavar roupa, existe ainda um mercado do mesmo tamanho daquele atualmente coberto para ser conquistado. E a obsolescência dos eletrodomésticos e dos produtos eletrônicos, cria um mercado em constante renovação.

 

Nada mais saudável para a continuidade da expansão do consumo e, em última análise, do emprego na indústria abastecedora, no varejo e nas empresas de crédito e financiamento, do que esse natural desejo dos consumidores de terem acesso aos novos e mais modernos produtos que são lançados.

 

Esse desejo de evolução e melhoria contínua faz parte da essência do capitalismo e alimenta o saudável e desejável desenvolvimento econômico, em especial num país com uma população com idade média inferior a 30 anos como é o caso do Brasil.

 

A questão que se impõe discutir e não transigir na atenção que o consumo merece, envolve o fato que o aumento do emprego formal perdeu seu vigor, a expansão da renda real é cada vez menor, a oferta do crédito está mais limitada pela excessiva cautela do sistema financeiro privado e, como consequência, o nível de confiança do consumidor só tem baixado desde o primeiro semestre do ano passado, criando um pernicioso e indesejável cenário de preocupação e contenção do consumo.

 

O país precisa de crescente atenção com sua debilitada infraestrutura e qualquer pessoa de bom senso reconhece isso, porém, fazê-lo à custa de uma redução de atenção e apoio à expansão do consumo é miopia e incoerência.

 

Insistir nesse raciocínio, de elementos excludentes entre atenção ao consumo e à infraestrutura, só poderá agravar o quadro que se desenha e que só pode ser revertido pela liderança positiva e inspiradora dos que conseguem enxergar um futuro melhor pela conjugação virtuosa de atenção e investimentos que garantam a continuidade da expansão do consumo das famílias.

 

Só isso poderá gerar a expansão da indústria que abastece essas categorias de produtos, além do próprio varejo e as empresas de serviços que atuam no setor.

Qualquer outra postura que envolva menor atenção ao consumo é comprometer as conquistas havidas nesse período e, pior, frustrar a população recém- incorporada ao mercado e que quer continuar evoluindo na sua nova condição social.

 

Marcos Gouvêa de Souza (mgsouza@gsmd.com.br) diretor-geral da GS&MD – Gouvêa de Souza.

TAGS - Miopia, demonização, consumo, consumidor
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