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Armadilhas por Instituto Impulso

Postando em 05/06/2013

Conforme as indústrias de bens de consumo vão crescendo, ampliando sua carteira de vendas, conquistando novos clientes e sentindo-se mais seguras em relação ao seu potencial para se tornar uma marca de abrangência nacional, elas são forçadas a tomarem decisões relevantes quanto à forma como irão atender a esse mercado expandido. Trata-se de um momento necessário, natural e desejado, mas que encerra alguns perigos, pois, em muitas circunstâncias, as soluções encontradas para atender as necessidades da empresa nos seus primeiros passos rumo à expansão de suas atividades, poderão se converter em uma armadilha no longo prazo.

 

Na grande maioria das vezes e por uma questão de prudência, o modelo adotado acaba por privilegiar uma composição de alternativas indiretas de abordar o mercado: distribuidores, atacadistas e/ou representantes comerciais. Algumas poucas contas são reservadas para serem atendidas diretamente pela empresa, particularmente aquelas de maior relevância ou cuja proximidade física facilita o contato e cria vínculos entre os executivos de lado a lado.

 

As outras regiões, mais distantes da sede da empresa, serão atendidas em conformidade à “densidade” de negócio potencial existente e à maneira como o segmento de distribuição indireta está desenvolvido em cada uma delas. Porém, de uma forma geral, é muito comum às empresas neste estágio do seu desenvolvimento, homogeneizar o modelo o máximo possível, reduzindo a complexidade na administração das vendas e do relacionamento comercial.

 

Adicionalmente, a tendência é privilegiar a remuneração da força de vendas em bases variáveis ao invés de criar uma estrutura à custo fixo, o que aumentaria o risco financeiro da empresa no exato momento em que ela está recém decolando.

 

Durante anos e até mesmo décadas, o modelo tende a funcionar bem, garantindo crescimento nas vendas e aumento na penetração no mercado, porém suas limitações irão aflorando na proporção em que a (natural) ambição da empresa buscar atingir patamares mais elevados.

 

Concorrência é a principal razão pela qual as decisões tomadas no início da jornada de crescimento da empresa precisam ser repensadas. Ainda que exista um pensamento otimista, típico dos empreendedores, de que “o Brasil é muito grande e existe espaço para todos”, isso é mais verdadeiro quando o espaço ocupado no mercado é relativamente pequeno. Conforme a empresa cresce, ela suscita em seus concorrentes cada vez mais cautela e atenção e eles reagem, buscando atender melhor os mesmos clientes que sua empresa disputa.

 

A segunda das razões que demandará mudança na forma de atender é que o mercado amadurece. Fruto da maior consciência do consumidor, de uma maior disseminação de informações, de maior e mais sofisticada oferta e que exigirão de cada uma das empresas que disputam um espaço nesse mercado uma forma de atuação mais adequada a esta nova dinâmica:

Redes regionais, que eram tradicionalmente atendidas pelos representantes ou distribuidores, começam a ficar irritadas porque não recebem o mesmo grau de atenção daquelas mais próximas à sede da empresa;

 

Executivos que trabalhavam em grandes empresas de varejo vão trabalhar em empresas menores, fora dos grandes centros e trazem expectativas de receber um nível de atendimento similar àquele que recebiam em suas “antigas casas”;

 

Consumidores que têm oportunidade de viajar e com possibilidade de experimentar o processo de compra em lojas das “capitais” e mesmo do exterior, comentam, comparam, reclamam... etc. e isso provoca uma reação dessas redes, que buscam apoio de seus fornecedores para poderem se adaptar aos novos padrões de referência de seus clientes. Sem contar com o fato que, o maior grau de aceitação dos consumidores de todas as regiões do Brasil em realizar compras pelo e-commerce, aumenta de forma dramática a gradiente de mudança dessas referências.

 

Evidentemente que tais pressões por mudança requerem um nível maior de atenção e de investimento nas operações de um maior número de clientes varejistas, do que naquele momento em que a forma de atuar no mercado foi desenhada.

 

Ocorre que essa maior profundidade no atendimento: melhor nível de serviço, ações de ativação nos pontos de venda,  treinamento e capacitação da força de vendas, presença de promotores seja em eventos promocionais específicos ou no apoio aos processos de demonstração de produtos e apoio aos vendedores, apoio consultivo para revisão de layout, exposição dos produtos etc.; é muito difícil de ser compatibilizado com o modelo tradicional de atendimento sendo realizado por intermediários.

 

Esse recurso que ajudou a empresa a conquistar mercados com baixo risco operacional, se torna em algum momento uma barreira ao aperfeiçoamento do modelo de atendimento para, pelo menos, um determinado canal. Na maioria dos casos, a opção por um modelo de relacionamento não exclusivo com os representantes, para evitar os riscos trabalhistas que isso pode significar, impede o desenvolvimento de um trabalho mais qualificado e que requer um investimento adicional de tempo, conflitando com o fato que os representantes ou distribuidores têm que dividir seu tempo com os produtos de seus outros clientes.

 

A impossibilidade de exigir dos representantes o cumprimento formal de um conjunto de metas, relativos ao bom desempenho comercial: crescimento de vendas, aumento de Market Share, aumento de presença nos Pontos de Venda, maior cobertura, expansão de mix, maior fidelidade dos clientes, etc.; é um forte entrave aos planos de qualquer organização.

 

Chega o momento em que o modelo precisa ser repensado, porém os custos da mudança são relativamente elevados e criam o temor de uma descontinuidade sobre o desempenho da empresa. A tentação de “deixar como está”, ainda que de forma envergonhada, aparecerá na discussão dos executivos das áreas comerciais.

 

Sem certa dose de audácia e muita persistência em se reposicionar, existirá para essas empresas, o risco de se deixar enredar na armadilha dos sucessos do passado, deixando de considerar o risco ainda maior de que os concorrentes que estavam em posição de desvantagem aproveitem essa oportunidade de, por meio de um melhor modelo de atendimento, ocupem um espaço adicional na relação com seus clientes, uma vez que, oferecer produtos de qualidade, preços competitivos e uso de marketing inteligente, tornam-se cada vez mais condições necessárias porém não suficientes no jogo competitivo e a adequada presença dos produtos nos pontos de venda é fundamental para induzir a percepção do consumidor para a sua marca, para o que o modelo de atendimento é fundamental para fazer isso acontecer.

 

Alexandre Horta (horta@gsmd.com.br), sócio sênior da GS&MD - Gouvêa de Souza

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