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O ritual burocrático nas empresas e o papel de cada área por Administrador

Postando em 26/03/2014

Dizia um amigo que muitas pessoas passavam a vida a “lubrificar as engrenagens do Sol”, com o objetivo de garantir que o Astro Rei renascesse a cada manhã. Era uma forma irônica de caracterizar esforços absolutamente inúteis, uma vez que as tais engrenagens já foram “adequadamente projetadas”, de forma a não precisarem de nenhum tipo de preocupação e de manutenção.

 

Em muitas organizações observamos situações como essa, em que determinadas pessoas, ou mesmo áreas inteiras, dedicam-se a gerar informação, preparar relatórios, enfim, cumprir rotinas, cuja real contribuição ao progresso dessas empresas é muito pequena, porém sentem-se imprescindíveis para garantir o renascer do sol.

 

Ainda que o ser humano tenha a tendência de sobrevalorizar o seu papel e a sua importância, nem sempre a culpa desse tipo de situação cabe exclusivamente a esse comportamento, decididamente natural. A principal responsabilidade recai sobre a maneira com que as responsabilidades são distribuídas entre áreas e pessoas, tornando o trabalho excessivamente compartimentado e, de como um tipo arraigado de cultura, privilegia o “cada um cuida dos seus interesses”, fazendo com que cada departamento ou área de uma grande empresa, tenha pouco conhecimento sobre o que e o como se organizam e trabalham suas áreas vizinhas. Ainda que esse tipo de problema não seja exclusivo das grandes organizações, a exigência de um maior mecanismo burocrático para administrar grande contingente de pessoas, inclusive em uma larga extensão territorial, tende a ser mais presente em grandes do que em pequenas empresas.

 

Mesmo determinadas rotinas, relatórios, quadro de indicadores, regras, limites de autoridade, etc.; que são indispensáveis para o correto funcionamento de qualquer empresa, perdem sua validade ou a sua pertinência de tempos em tempos, pela simples e imperiosa necessidade de mudança, que um consumidor insaciavelmente mutante, alterações tecnológicas e um quadro de forte competição, impõem a absolutamente todas organizações, particularmente àquelas relacionadas ao universo do consumo.

 

Mudança já é uma palavra chave na maioria das organizações há bastante tempo, porém, as ferramentas que elas podem se utilizar, de modo a garantir os seus processos e rotinas adequadamente upto date à realidade do negócio, nem sempre são seguidas à regra, pois implicam em lidar com feudos de poder e administrar as consequentes inseguranças associadas a esse tipo de situação. Em mais de uma circunstância, partes da organização ajustam-se à necessidade, ou ao menos flexibilizam-se, porém outras resistem e por um processo de procrastinação ou acomodação mais comuns do que seria desejável, cria-se um Frankenstein em termos de alguns processos integrados e fluxos de informação fluidos, com outros pouco eficientes, esperando-se uma oportunidade futura para corrigir aquela anomalia.

 

 

“Fulano vai se aposentar em breve, não vale a pena fazer disso um cavalo de batalha”, “o ótimo é inimigo do bom”, “fizemos um Pareto sobre os nossos processos que necessitavam de ajustes”, etc.; são as frases que mais costumamos ouvir quando solicitados argumentos para o fato de que alguns “rabichos” foram deixados para trás (e todos eles soam muito razoáveis aos ouvidos incautos). Ocorre que qualquer empresa é um organismo em que cada um dos seus componentes possui um papel específico e único, que precisa interagir com todos os demais de forma a garantir a correta execução da estratégia da empresa. Quando um desses componentes (ou órgãos) não funciona a contento, isso produz retrabalho, falhas e geralmente exige algum tipo de compensação em termos de estrutura adicional em outras partes, como forma de equilibrar a área disfuncional. Pior, por não ser sempre que a conjuntura política que produziu um determinado momentum de mudança está disponível, aquela situação pode perdurar por um longo tempo até que um novo ciclo de mudança e necessidade de incrementar a produtividade venha a surgir, impondo custos desnecessários ocorridos durante este período de espera.

 

Ainda que possa parecer mais uma fábula do que a realidade do mundo empresarial, essa é uma das formas clássicas que explicam porque certas áreas executam tarefas que, quando observadas à luz de uma visão integrada, e com os olhos postos nos objetivos estratégicos da organização, parecem mais afeitas à prática de um ritual burocrático do que em gerar efetivo valor.

 

A sustentabilidade de uma organização, que opera sob um ambiente competitivo, requer uma permanente avaliação quanto à pertinência e eficácia dos seus processos de trabalho, assim como a alocação dos indivíduos mais adequados em termos de competência e perfil, respondendo por eles. Isso pressupõe liderança sobre os indivíduos de forma que todos possam sistematicamente se ajustar e colaborarem nos momentos (e que serão cada vez mais frequentes) que as organizações precisarem mudar.

 

Como já foi dito em outras ocasiões, a sobrevivência no longo prazo pressupõe organismos mais adaptáveis do que necessariamente fortes. Os dinossauros dominaram um longo período da história de nosso planeta, porém não tiveram condições para se adaptarem às mudanças ocorridas no clima da Terra. E o Sol renasceu em cada dia desse longo período.

 

Alexandre Horta (horta@gsmd.com.br), sócio sênior da GS&MD - Gouvêa de Souza.

 

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